As antigas carrinhas Bedford voltam a estar na moda no Douro, depois de terem caído em desuso, e são usadas para o trabalho nas vinhas de encostas íngremes e como meio de transporte para turistas em quintas.
São veículos robustos e de muita força e foram usados durante décadas para transpor o terreno íngreme do Douro, conseguindo aguentar toneladas de uvas, vinho, material ou trabalhadores. Com o tempo foram caindo em desuso, abandonadas em garagens ou terrenos agrícolas e agora voltam a “estar na moda”. Há oficinas que as recuperam e os proprietários usam-nas para o transporte de turistas ou para o trabalho na vinha. Há quem lhes chame os “clássicos do Douro” e são cuidadas como peças de coleção.
“Esta carrinha sobe em qualquer lado. Onde as outras se negam esta não se nega. Com quatro mil quilos sai de qualquer lado. Posso parar ao cimo, dou-lhe gás e toca a andar”, afirmou à agência Lusa José Estável, de 76 anos e viticultor em Ervedosa do Douro, no concelho de São João da Pesqueira. Esta freguesia é uma das maiores produtoras de vinho do Porto da região demarcada e chegou a ter cerca de meia centena destas viaturas, que foram produzidas na Inglaterra, pela Bedford, entre o final dos anos 50 até meados dos anos 80, do século passado.
José Estável contou que pagou “80 contos” (400 euros) pela carrinha há cerca de 30 anos. Já era usada. “Andei e andei com ela e depois, coitada, começou a avariar e encostei-a num cardenho”, referiu. Foi o filho que pegou nela anos mais tarde e a recuperou. Está pintada de verde e confunde-se com as folhas das videiras. “Agora, tem-se enchido de trabalhar na mão dele e eu quando preciso também a vou buscar”, afirmou.
Na margem oposta do rio Douro, em Gouvinhas, Sabrosa, a Quinta do Crasto utiliza uma Bedford azul para ir buscar os turistas à estação ferroviária ou ao cais fluvial do Ferrão. Na caixa aberta da carrinha foram colocados bancos e escadas de madeira. “O protagonismo que esta carrinha ganhou aqui dentro superou até as minhas melhores expectativas. Tudo começou com uma paixão minha pela Bedford, que é um carro que eu sempre vi a circular aqui no Douro”, afirmou à Lusa o administrador Tomás Roquette. As visitas às vinhas são também feitas na carrinha, que, apesar de ter sido adaptada para turismo, ainda é utilizada para trabalho na propriedade. Tomás Roquette adiantou ter a intenção de adquirir pelo menos mais uma destas viaturas para aumentar a oferta turística. “Acho que as Bedford se vão tornar cada vez mais numa relíquia”, afirmou.
A Quinta do Crasto foi considerada recentemente uma das melhores propriedades vinícolas do mundo, ocupando o quarto lugar do top 50 da lista “The World’s Best Vineyards”. Aqui chegam cerca de 5.500 visitantes por ano. Manuel Bastardo tem uma oficina em Ervedosa onde concilia o trabalho do dia-a-dia com a recuperação das antigas viaturas. Tem 50 anos e a Bedford que recuperou para si é mais velha dois meses. “Comecei a trabalhar nisto aos 15 anos. Naquela altura havia cá muitas Bedford”, referiu. Depois, contou, os veículos começaram a ser encostados, nos terrenos ou nas garagens e outros foram para a sucata. “Até pagavam para as tirar de cá e agora anda tudo atrás disto. Voltam a estar na moda”, sublinhou. Segundo o mecânico, antigamente “não havia dinheiro para comprar carros novos e estes eram acessíveis”. “Acho que agora até estão mais caros”, frisou.
Na principal avenida do Pinhão, concelho de Alijó, António Marques tem uma oficina onde se dedica quase em exclusivo ao restauro de carrinhas Bedford. Foi num destes veículos que aprendeu a conduzir e há uns anos foi desafiado por um amigo para recuperar uma que estava em “péssimo estado”. Na antiga oficina que era do pai havia peças e embarcou numa aventura que já vai em “oito viaturas recuperadas”, umas para turismo, outras para o trabalho e outras ainda apenas “para coleção”. António Marques trabalha na parte mecânica (travões ou motor) e depois recorre a um pintor e a um chapeiro para concluir o trabalho que pode demorar entre dois a seis meses e se tudo correr bem. “Já começamos a ter alguns problemas em arranjar materiais, como jogos de juntas ou farolins. Onde temos arranjado material agora é na Índia”, referiu. Este é, na sua opinião, um “carro muito identificativo” do Douro e, que agora, com o aumento da procura, “já começa a escassear”.
Depois de recuperados podem atingir, segundo os mecânicos, os 12 mil e 13 mil euros. A 04 de agosto realiza-se um passeio de carros antigos a partir de Ervedosa, que tem como cabeça de cartaz as Bedford. Francisco Pinto pertence à organização do evento e afirmou que estas carrinhas se transformaram “numa atração turística” do Douro.
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FONTE: LUSA